quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Parabéns, coronéis.

- Renato, estive a ver uns vídeos no YouTube e como pode a propaganda política no Brasil ter palhaços, fantasias de super-homem, Barack Obama e todo tipo que lembra tudo menos política?

Foi aproximadamente esta a pergunta que recebi de uma colega de laboratório enquanto almoçávamos, um dia após o resultado das primeiras eleições deste ano. Neste momento, sinceramente, além da vergonha que tive, também não sabia de detalhes das eleições no Brasil, apenas o que foi noticiado em Portugal. Ou seja, 13 e 45 na segunda mão para o mais alto escalão da república.

Cheguei do almoço, e acessei o portal do Estadão, que ainda é gratuito. Comecei com os majoritários. Passei por onde já residi. Na seca braba, Alckmin foi reeleito, Lasier seguiu os passos da Ana Amélia no RS e Frejat no DF. O Frejat, para quem não sabe é o segundo substituto consecutivo nas eleições no DF e pelo mesmo motivo: os principais candidatos foram barrados pelo ficha limpa. A 1ª tentativa foi uma frustada e engraçada ideia de Roriz emplacar a sua esposa, Weslian. Famosa pelos seus desastrosos debates, que rendeu o 1º lugar no TOP FIVE do programa humorístico CQC, ela, assim como o substituto de José Roberto Arruda, chegou ao 2º turno. Para o congresso nacional, Tiririca novamente eleito em SP, seguido do Pastor Feliciano. O eleito "racista do ano" por uma ONG inglesa depois de distribuir amor a "tudo aquilo que não presta, quilombolas, índios, gays e lésbicas", Luiz Carlos Heinze, foi o mais votado no RS, tal qual o outro amoroso Bolssonaro no RJ, que também elegeu o seu filho para a assembleia carioca. Ao lançar o olhar para outras partes do Brasil, o destaque vai para o bonitinho Collor, que furou fila em sua sessão para votar e foi eleito novamente senador de AL. 

Ainda bem que lembrei do muito trabalho que ainda havia para aquela tarde e fui corar mais lâminas de esfregaço de sangue de meu querido ensaio em terras lusitanas. E fui com aquela sensação que, como o carnaval, se repete nos anos de eleições nacionais e municipais. Bem verdade que tive algumas felicidades também, como por exemplo a Manuela no RS e a ex-bancária Érika Kokay, uma colega que tive o prazer em conhecer no DF, a Bahia que afastou de vez o ACM e o baixinho 11, senador carioca.

Enquanto corava, fui além da pergunta de minha colega, como podemos elegermos tanta coisa amorosa? O jornalista Leonardo Sakamoto em seu blog argumenta que o congresso não ficou pior. Apenas está mais parecido com o Brasil.

A tarde passou e a ressaca da eleição desabrochou nas redes sociais, ou ao menos foi quando tomei conhecimento, na noite daquela segunda-feira. E até hoje, quatro dias após, não parou.

E de repente, outra vergonha desabrocha. O amor, o carinho, a educação e o respeito que um eleitor possui com aquele opositor ao seu voto. Disse no facebook, de repente, o Brasil virou Gre-Nal. Mas, no pior sentido que isso possa representar, o do fanatismo cego. Daquele que ao ver claramente a falta dentro da grande área, berra convincentemente, "NÃO FOI NADA! Amarelo pela simulação, e é o segundo! Tem que ser expulso esse FDP!". E se por acaso, o juiz erra favoravelmente ao seu clube, aplaude-o com maior fervor que um metaleiro em seu primeiro concerto do Megadeth. Infelizmente, é assim que andam as eleições brasileiras.

E comecei o auto-questionamento socrático, Por quê, por quê e por quê? 


Foi quando lembrei do livro que estou a ler, Verdade Tropical, do nordestino Caetano Veloso. Na semana passada fiquei espantado ao tomar ciência que ele teve aulas de francês, durante o ginásio, numa escola pública em Santo Amaro, interior da Bahia. Nesta altura, ele também assistia à cinemas italianos, franceses entre outros além dos americanos em 3 cinemas que haviam nesta pequena cidade. Foi em Santo Amaro também, que CV teve contato pela primeira vez com o estilo que acabava de ser criado por João Gilberto. Acompanhado de sua irmã mais nova, Maria Bethânia, e de outros amigos ginasiais, ficava em frente ao bar do Bubu, que tocava repetidamente o disco Chega de Saudade. Não a toa, João Gilberto é também uma forte influência na carreira de Caetano. Tanto João, quanto Caymmi, como a Tropicália traziam em sua essência a brasilidade e rejeitavam naturalmente a influência comercial das gravadoras norte-americanas.

Mas, por que trouxe essa reflexão para este texto? Por que falei em língua estrangeira no ensino médio? Por quê comentei em cultura e brasilidade? Por que comentei em Tropicália, que nascera e vivera seu auge em plena ditadura militar?

A resposta está diante de nossos olhos. Reparem na consequência histórica, sob o ponto de vista político, que a geração de Caetano, Gil, Chico e de meu pai tiveram ao terem acesso a um ensino básico de qualidade, ao terem acesso à cultura e ao orgulho patriotista que brotava nesta juventude "transviada". Responda tu mesmo(a), leitor(a), como vai a nossa juventude atualmente? Qual é o estilo musical que ela propõe? Qual o cinema que ela assiste? Qual arte ela se interessa?

Hoje, cada vez menos o brasileiro aceita uma opinião diferente. Ofendem gratuita, verbal e fisicamente como trocam de roupa. E aqui, engana-se quem acredita que é mérito apenas da política. Não raros são os duelos entre os que se julgam inteligentes e os analfabetos funcionais a respeito da opção sexual, das diferenças de gênero e racial. Ou para usar uma expressão corriqueira, das minorias X maiorias. O negocio hoje é bipolar, ou tu estás lá ou cá. Ou trepa ou sai de cima! Não tem vinho, dança, carícias, nem troca de olhares 43. Ou cospe na mão, ou a fila anda.

E nesta realidade de diálogos acirrados, quem sai fortalecido? Nesta última eleição foi o famoso e importante partido republicano brasileiro. O PRB pulou de oito deputados eleitos em 2010 para 21 agora e assistiu de camarote a queda da atual bancada governista (PT e PMDB encolheram 15%) bem como a estagnação da tucanada. Ou seja, esses partidos que ficaram em cima do muro e ainda jogavam lenha na fogueira de temas polêmicos farão como manda a cartilha da política brasileira. Quer quem seja o presidente nos próximos anos, o apoio dará em troca de benefícios próprios e não da pátria.

Parabéns, coronéis, vocês venceram outra vez. O congresso continua a serviço de vocês. (Herbert Vianna)

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