sábado, 5 de abril de 2014

Procure saber

"Produzir, articular e disseminar conhecimento para aperfeiçoar as políticas públicas e contribuir para o planejamento do desenvolvimento brasileiro"
Isso que acabas de ler é a missão do IPEA, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, vinculado à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Em seus quase 50 anos de existência, arrisco dizer que nunca o IPEA esteve tanto na boca do povo como nas últimas semanas. O motivo, tu já deves saber. No dia 27 de março, na sede do instituto em Brasília, foram divulgadas duas pesquisas por diretores do mesmo. Uma delas foi o motivo de todo o bafafá, intitulada "Sistema de Indicadores de Percepção Social (SIPS)".

A jornalista Nana Queiroz inicia um movimento em reação à pesquisa SIPS

E foi pelas redes sociais que o IPEA caiu nas (des)graças do povo, especialmente, da ala feminina. De repente, tudo virou hashtag não mereço ser estuprada. E, eu que não sabia do que se tratava, talvez por não estar no Brasil, fiquei um bocado irritado com um mundaréo de amigas minhas a aderir este movimento.

"Puts, eu mereço ler isso?" e "Uaw, se você não merece, quem é que merece?" foram algumas de minhas inquietações com esta onda. Buenas, feicibúque é assim mesmo, amanhã não tem mais nada, pensei e fui durmir. Entretanto, ainda com isso na cabeça. No outro dia, mais do mesmo... Ô cacildis da minha avó, que p#%*a é essa? E, então, eis que um músico riograndino expôs sua indignação através da mesma rede que o bombardeava, a qual eu compactuei e comparti com meus amigos.

Pronto! Foi a fagulha que bastava para o estopim. Diálogos, ora em bom tom, ora acirrados, tomaram conta de quem questionou este movimento. Eu felizmente provei do primeiro, mas meu amigo William Tavares experimentou o segundo. Em diversos caso das pessoas que possuíam uma opinião contrária ou mesmo aquelas que apenas questionavam este movimento foram muitas vezes taxadas como integrantes de uma maioria. Você não passa por isso, você é homem, é branco e é heterossexual. Isso também aconteceu comigo.

- alguém aí sabe qual o perfil do entrevistado? Quem foi que solicitou tal pesquisa e qual foi o órgão? Foram as perguntas que eu fiz no post que compartilhei. E, antes mesmo de alguém responder, eu mesmo fui atrás disso e aí, plim! Primeiro, caiu a ficha de todo o bafafá. Era porque a pesquisa dizia que 65,1% dos entrevistados concordavam total e parcialmente que: Mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas. Bem, vamos mais saber mais?

Quantas pessoas participaram?
- 3810.
Qual o perfil? - E aqui os espantos!
- 66,5% dos entrevistados pertenciam ao sexo... adivinhem? Feminino!?!
- 65,7 e 24,7% declararam ser católicos e evangélicos, respectivamente.
- 41,5% possuem o ensino fundamental incompleto, onde se enquadraria o atual secretário do Cassino, Nando Ribeiro, caso participasse dessa pesquisa.
- R$ 531,26 era a renda média domiciliar per capita.

Tirem vocês mesmos as suas conclusões!

Bem, nem todas as pessoas foram atrás dessas informações. E, algumas que foram ainda trataram como se estes dados dos participantes estivessem nas entrelinhas. Então, como é moda, essas lançaram um outro movimento de hashtag, eu não mereço ser enganada pelo IPEA. Alto lá, enganadas? O IPEA publicou todas as informações acima e qual foi a má fé do IPEA? Perdão, mas se alguém agiu de má fé, se essa seria a melhor expressão, esse alguém chama-se Nana Queiroz, cuja sua profissão é justamente divulgar informação, conhecimento! Apenas porque deram-se o trabalho de informar-se, julgam-se como enganadas. Já vejo a cena no próximo vestibular ou concurso público, uma onda de hashtag Eu não mereço ser enganado pela FUVEST ou pela CESGRANRIO. Nem tanto ao céu, nem tanto à terra, não é?

A ex-universitária (?) Geisy Arruda estuprou foi o português hehe
Entretanto, para mim, ninguém teve pior atuação nesta história toda que a Dilma Roussef, a nossa presidenta. Ela foi solidária à jornalista Queiroz. A pena foi que Dilma perdeu uma excelente oportunidade de divulgar e pronunciar-se a respeito da segunda pesquisa que foi anunciada no mesmo dia da SIPS, como anunciei acima. A nota técnica intitulada: Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde foi, para nosso conhecimento, "a primeira pesquisa a traçar um perfil dos casos de estupro no Brasil a partir de informações de 2011 do Ministério da Saúde". Ou seja, fotografou um cenário real tupiniquim. E se tu, leitor(a), já ficastes espantado(a) com os dados acima apresentados, poderás chocar-te ainda mais com este estudo. Estima-se que no mínimo 527 mil pessoas são estupradas por ano no Brasil e apenas 10% chegam ao conhecimento da polícia. Dessas que possuem conhecimento, 89% das vítimas são mulheres e nada menos que metade são crianças de até 13 anos. Se somarmos jovens e adolescentes, de 14 a 17 anos, este número salta para 70%.

Respira!

Não, você não leu errado. Metade das vítimas de estupros são crianças de até 13 anos. Inevitável não fazer o questionamento, crianças usam roupas a mostrar o corpo e por isso são atacadas? E o choque não para por aí. O cenário brasileiro aponta que apenas 12,6% dos estupros cometidos em crianças são desconhecidos. Amigos, padastros, pais e namorados das mães são os que encabeçam a lista de violência aos miúdos. "No geral, 70% dos estupros são cometidos por parentes, namorados ou amigos/conhecidos da vítima, o que indica que o principal inimigo está dentro de casa e que a violência nasce dentro dos lares.", diz a nota do IPEA.

E, então? Concordas comigo que a Dilma perdeu uma oportunidade de pronunciar-se a respeito desta triste realidade brasileira e que isto merece mais a atenção que uma pesquisa de opinião? Ou será que aproveitou o desvio de atenção para varrer a sujeira para baixo do tapete? Sim, pois vamos lembrar que o IPEA é vinculado à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Ou seja, lá está para assessora-la.

A presidenta perdeu uma excelente oportunidade de pronunciar-se a respeito da realidade brasileira. Mas, será que convém? 
Mas, o tema tem pano para a manga... Ainda ontem, 4 de Abril, o IPEA divulgou uma errata(?). Na publicação da pesquisa SIPS, houve uma inversão de gráficos em duas perguntas. E qual era a pergunta que primariamente fora publicado com dados trocados? Pode rir, a própria!

Veja a inversão que o IPEA fez e os reais valores da pesquisa:

Mulher que é agredida e continua  com o parceiro gosta de apanhar (Em %)

Sim, 65,1% concordam. Porém é com a afirmação acima.

Mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas (Em %)

Apenas 26% dos entrevistados concordam que a mulher que veste-se mal deve ser atacada.
Buenas, quem também não pode perder a oportunidade sou eu. Isto, pois que mencionei um grande parceiro das noites cassineiras e um excelente músico, William Tavares. Segue uma canja dele de uma música cujo um trecho cabe neste post... Isso aqui ooo é um pouquinho de Brasil iaiá!


O William tem um canal no youtube, quem quiser conferir um pouco mais do trabalho dele pode aceder aqui. Ou, melhor ainda, vá a alguma balada em Rio Grande, que muito provavelmente o verá ao vivo. 

 O que achou?

P.S.: Se você quiser aceder as duas pesquisas, basta clicar no nome por extenso de cada pesquisa citados no texto.